quarta-feira, 9 de dezembro de 2015

Atos dos Apóstolos

1
1-11
O “primeiro livro” é o Evangelho de Lucas.
Recebemos o mesmo Espírito que guiou toda a missão de Jesus, os apóstolos estarão preparados para testemunhar Jesus, continuando o  que ele começou a fazer e ensinar. Essa é a tarefa apostólica de todos os cristãos, que formam a comunidade de Jesus. Através do testemunho deles, Jesus ressuscitado continua presente e atuante dentro da história.
O Reino não vai surgir de um momento para outro na história, como por toque de mágica ou milagre. Ele será fruto do testemunho dado pelos discípulos no mundo inteiro. E só o Pai sabe o momento em que a história da humanidade estará completamente madura, para então se manifestar a plenitude do Reino.
A ascensão de Jesus é um modo de falar sobre a sua volta para o mistério da vida de Deus. Aliás, Deus está presente em todos os tempos e lugares. E o fato de os cristãos esperarem por Jesus não deve deixá-los passivos, mas levá-los a missão, pois a vinda gloriosa de Jesus se realizará através do testemunho.
2
1-13
O relato é simbólico. De fato, quando o autor escreveu, as comunidades cristãs já se haviam espalhado por todas as regiões aqui mencionadas. Lucas quer mostrar o que está na base de qualquer comunidade cristã: o Espírito Santo faz lembrar, compreender e continuar o testemunho de Jesus (cf. Jo 14,26; 16,12-15). Pentecostes celebrado cinqüenta dias depois da Páscoa, comemorava a Aliança e o dom da Lei. No novo Pentecostes, Deus entrega o seu Espírito, realizando a nova Aliança, dessa vez com toda a humanidade (doze nações). A “língua” da comunidade da nova Aliança é o testemunho de Jesus, ou seja, o Evangelho, cujo centro é o amor de Deus que reúne os homens, provocando relação e entendimento (o contrário de Babel: cf. Gn 11,1-9). Mas o testemunho provoca conflitos (v. 13).
14-36
Pedro apresenta o anúncio fundamental da Igreja. Mantendo a memória do testemunho de Jesus, a Igreja relê o Antigo Testamento e percebe o mistério central da vida, morte e ressurreição de Jesus: Jesus de Nazaré realizou entre os homens a ação de Deus voltada para a justiça e a vida, e foi morto pêra estrutura injusta de uma sociedade que gera a morte. Deus, porém, condena essa estrutura, pois ressuscita Jesus e o torna Senhor do universo e da história. Recebendo o Espírito que dirigiu toda a missão de Jesus, a Igreja se torna testemunha da sua ressurreição. O anúncio é ao mesmo tempo a denúncia e o julgamento de toda a estrutura injusta, sempre causadora da morte.
37-41
O anúncio da Igreja faz com que as pessoas tomem consciência do seu próprio pecado,  já que elas percebem estar comprometidas com uma estrutura social que gera injustiça e morte. O que fazer? É preciso morrer para esse tipo de sociedade e ressuscitar para pertencer ao povo de Deus; povo comprometido com o testemunho de Jesus Cristo. O batismo, onde a pessoa recebe o Espírito, é a expressão concreta dessa conversão.
42-47
Lucas apresenta o primeiro retrato da comunidade cristã. Ela nasce do anuncio fundamental que provoca a conversão; cresce graças a catequese evangélica (ensinamento dos apóstolos) e se espalha através do testemunho. Internamente a comunidade se mantém pela união com Deus (Oração no Templo) e pela participação na Páscoa de Jesus (fração do pão = Eucaristia). Na vida prática, a conversão se exprime por um novo modelo de relações: a fraternidade substitui a opressão do poder, e a partilha dos bens supera a exploração do comércio. A única autoridade é a de Deus, e se exprime através de prodígios e sinais que acompanham o testemunho dos apóstolos (temor). Para Lucas, a vida dessa comunidade mostra o sinal da Igreja e o projeto de nova sociedade.
3
11-26
O povo estranha o fato novo que a comunidade cristã realiza em nome de Jesus. O fato se transforma em anúncio fundamental, convidando à conversão. O centro do texto é o nome de Jesus. Quem é Jesus? A releitura do Antigo Testamento leva a comunidade a reconhecer e anunciar Jesus como o Santo, o Justo, o Profeta definitivo e o Servo-Messias, que vai  transformar radicalmente a condição humana, realizando o projeto de Deus e restaurando todas as coisas. Doravante, a ação de Deus em favor dos homens se realiza mediante  o nome de Jesus.
4
1-22
O fato novo provoca uma nova consciência no povo e, ao mesmo tempo, a reação negativa do Sinédrio, autoridade suprema na sociedade judaica. A ressurreição de Jesus apresentada como fato a partir de outro fato: a cura do aleijado. O Sinédrio não pode negar aquilo que todos conhecem. Também não podem aceitar que a cura foi realizada em nome de Jesus, que tinha sido condenado e morto por iniciativa do próprio Sinédrio; este não pode aceitar que Jesus esteja vivo e continue fazendo o bem. Mas, como não há outro modo de explicar a cura e se teme a opinião pública, resta apenas uma atitude: reprimir os apóstolos, proibindo-os de continuar uma prática ligada ao nome de Jesus.
32-37
Lucas vai salientando o crescimento da comunidade (cf. 1,13. 15; 2,41.48; 4,4). Agora já é uma grande multidão, pois o fermento  cristão penetra e transforma a sociedade. O  centro do retrato é o espírito de comunhão que gera concórdia fraterna e partilha dos bens. Não se decreta uma lei para fazer uma “caixa comum”, uma espécie de “capital” de sociedade anônima. Pelo contrário, trata-se de partilha livre e consciente, exigida pela necessidade de um e voltada para os mais necessitados, de modo a destruir o contraste e a distância entre ricos e pobres. O exemplo de Barnabé mostra que a comunidade primitiva rompe com o espírito de posse e propriedade privada: os bens são destinados ao uso de todos.
5
12-16
O terceiro retrato mostra como a ação de Jesus ressuscitado continua na prática da comunidade cristã. Esta realiza a ação que liberta da alienação a consciência ("espíritos maus"). Consequentemente, liberta os corpos oprimidos (doenças). A sombra de Pedro relembra a própria ação de Deus protegendo o povo no tempo do Êxodo. Favorecido, o povo acolhe e adere à ação da comunidade; "outros" (v. 13) temem o poder das autoridades e não se atrevem a pertencer a esse grupo inovador.
21b-33
As autoridades se reúnem para decidir sobre a sorte dos apóstolos. Enquanto isso, estes ensinam o povo, que já está disposto a tomar uma atitude contra os poderosos. Apesar da proibição (cf. 4,18), os apóstolos continuam ensinando em nome de Jesus. Interrogado, Pedro mostra a razão da desobediência: Ressuscitando a Jesus, Deus julga e desautoriza a autoridade do Sinédrio, que o condenou e matou. A ressurreição é o fundamento da liberdade de testemunhar.
34-42:
Para as autoridades, o fenômeno cristão é movimento de insurreição política, como qualquer outro. Gamaliel apresenta o significado profundo do confronto com o movimento cristão. Por trás do princípio de tolerância e também de liberdade, mais acima afirmada por Pedro (4,19s), está em jogo uma opção radical: obedecer a Deus ou aos homens; adotar a lógica de Deus na liberdade que provém da vitória sobre a morte, ou obedecer a lógica humana, que tem como fundamento o medo da morte e que se firma no poder repressivo que provoca tortura e morte. Mas, o cristianismo vem de Deus, ninguém poderá detê-lo...
8
5-8
O autor apresenta Filipe como exemplo da evangelização que se propaga a partir de Jerusalém. A missão cristã é mostrada nos mesmos moldes previstos pelo Evangelho: anúncio do caminho de Jesus Cristo e ação que desaliena  os homens (expulsão dos demônios), possibilitando que eles se tornem responsáveis pela própria caminhada (cura da paralisia). O resultado é a alegria trazida pela Boa Notícia.
9-25
Simão é alguém que busca prestígio a todo custo, recorrendo a venda de ilusões que fascinam e alienam o povo. Enquanto outros buscam o batismo para selar a conversão, Simão está interessado em milagres e em comercializar o dom de Deus. Reprovando-o, Pedro lembra a sena de Jesus expulsando os comerciantes do Templo (cf. Lc 19,45ss). O O texto é verdadeira condenação de qualquer comércio do sagrado. O que Deus dá gratuitamente, deve ser distribuído gratuitamente.
A missão de Pedro e João na Samaria é reconhecer a nova comunidade como parte integrante da Igreja. A imposição das mãos com o dom do espírito Santo mostra que as comunidades cristãs nascem sob o impulso do Espírito Santo.
9
26-30
O convertido enfrenta, além disso a desconfiança da comunidade, à qual começa a pertencer. Mas alguém da comunidade apresenta um argumento irrefutável e que cria solidariedade para com o recém-convertido: o testemunho corajoso.
10
1-33
Cesaréia está na fronteira da terra judaica com o mundo pagão. Fronteira que, na verdade, separa mundos e mentalidades. O judeu era limitado por dois grandes tabus culturais: a lei da pureza, que impedia comer certos alimentos (cf. Lv 11), como também a lei que proibia misturar-se com pagãos, igualmente considerados profanos e impuros (v. 28). Temos aqui a queda desses tabus; se fossem conservados, impediriam a Igreja, nascida em ambiente judaico, de se expandi pelo mundo pagão. O próprio Deus destrói a barreira entre os homens,  porque ele quer unir todos no único povo de seu Filho (VV. 34-35). A Igreja, portanto, deve distinguir entre o que é essência do Evangelho e o que permanece destinado tempo ou cultura. Uma ação missionária que confundisse o Evangelho com particularismos culturais não seria evangelização libertadora, mas colonização dominadora.
34-43
O texto reflete a essência da catequese primitiva. Na estrutura dessa catequese podemos ver a estrutura dos atuais evangelhos escritos; estes não são mais do que cristalização da catequese realizada em comunidades particulares.
O ponto de partida da evangelização de da catequese é o reconhecimento de que o povo de Deus é formado por todos aqueles que o respeitam e praticam sua vontade, ainda que de forma inconsciente e anônima. É essa prática da justiça que a evangelização visa descobrir, fazer crescer e educar, mostrando tudo o que Deus realizou em favor dos homens através de Jesus Cristo. Note-se que toda a atividade de Jesus está resumida numa frase que define o programa da ação cristã: fazer o bem e curar todos aqueles que estão dominados pelo diabo. Em outras palavras, trata-se de despertar relações justas entre os homens, a fim de que eles vençam a alienação e construam uma sociedade voltada para a vida que Deus quer.
44-48
Este é o pentecostes dos pagãos (cf. At 2,1-12). Note-se que os pagãos recebem o Espírito ao ouvir a Palavra; isso comprova que eles já aceitaram e se comprometeram com o Evangelho. A ação de Deus procede do próprio rito do batismo, que é sinal visível da pertença ao povo de Jesus Cristo.
12
1-25
O episódio apresenta o ápice e final da missão de Pedro no livro dos Atos. Marca também o fim da 1ª etapa da história da Igreja centralizada em Jerusalém e no mundo judaico. A intenção de Herodes é matar Pedro,  como fez com Tiago. O relato lembra de perto a morte e ressurreição de Jesus. A incredulidade dos irmãos (v. 15) lembra Lc 24,9-11. Os guardas sofrem a pena reservada ao prisioneiro que deixaram escapar; e a morte de Herodes aparece como punição divina, pelo fato de ele se absolutizar, colocando-se no lugar de Deus. O relato mostra, portanto, que Deus se solidariza com os pobres que lhe são fiéis, e se coloca contra o perseguidor. É nesse clima de solidariedade divina que as comunidades crescem e se multiplicam (v.24).
13
44-52
Os missionários cristãos estão entre dois grupos: os pagãos, que os acolhem com entusiasmo e alegria, e os judeus, que têm ciúmes, os recusam e reagem com violência. É um momento histórico para o cristianismo: a passagem do mundo judaico para o mundo dos pagãos. E a espada de dois gumes que divide os grupos não é mais a Lei, mas a Palavra de Deus, isto é, o anúncio da salvação; este exige ser acolhido para que possa introduzir os homens na vida inaugurada por Jesus ressuscitado. A experiência cristã não é apenas uma variante reformista do judaísmo.
15
1-5
Enraizado no ambiente judaico e pagão, a Igreja enfrenta o primeiro grande conflito. Os pagãos provenientes do judaísmo continuavam praticando a circuncisão e observando as prescrições da Lei. A evangelização não obrigava os pagãos convertidos a esses costumes judaicos. Contudo, alguns de Jerusalém (fariseus convertidos – cf. v.5) começaram a ensinar que também os pagãos, para se salvarem, deviam observar as mesmas coisas que os judeus convertidos. Em outras palavras, primeiro deviam ser “judaizados” e depois cristianizados. A questão era muito séria: os costumes judaicos pertencem á essência da  mensagem cristã? Até que ponto a ação missionária da Igreja transmite o Evangelho com determinado contexto sociocultural, impondo a um povo cosmovisão  de outro? O Evangelho é fermento libertador, e não super-estrutura que aprisiona e perverte a alma de um povo.
22-29
A carta conciliar não tem caráter dogmático; é apenas uma orientação pastoral. Quantos às restrições do v. 29, cf. nota anterior.
22
1-21
Com pequena diferença de pormenor, encontramos em Atos três relatos da conversão de Paulo (aqui em 9,1-9 e em 26,12-23). A insistência no fato se deve a três razões: mostrar que um judeu fiel, intruído e até fanático descobriu Jesus como o Messias prometido, e se converteu; mostrar que Paulo é apóstolo como os Doze, pois também ele teve experiência direta do Senhor ressuscitado; justificar a missão de Paulo junto aos pagãos. O que há de especial no presente relato e a menção de que a missão de Paulo entre os pagãos foi recebida no próprio Templo. Paulo responde assim aos judeus que o acusam de profanar o Templo, introduzindo aí um pagão.

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