Uma história para se fazer pensar.
Dona Matilde era uma mulher muito devota, mas tinha pouco tempo para os outros.
Um dia, ela se encontrava trancada no quarto, rezando o rosário, ouviu tocar a campainha. Irritada, foi atender. Era um andarilho pedindo um prato de comida. Rispidamente, ela lhe disse:
_ Agora não posso, estou rezando!
Após voltar para o quarto e retomar a sua reza, ouviu novamente a campainha. Dessa vez era a vizinha, que perdera o marido havia poucos dias e queria conversar com Matilde, para desabafar um pouco. Entretanto, a acolhida de Matilde não foi lá essas coisas:
_ Volte mais tarde, querida, que agora não posso escutar você. Estou rezando o rosário.
Enquanto rezava, dona Matilde cochilou e sonhou que estava se encontrando com Jesus. Imaginou-se dizendo a ele:
_ Senhor, como eu gostaria de receber sua visita em minha casa!
Ao que Jesus respondeu:
_ Pois é, Matilde, hoje eu estive com você duas vezes e você não me recebeu...
Espiritualidade: amizade com Deus, amizade com o irmão.
É comum ouvimos dizer que uma pessoa espiritual é aquela que reza bastante, que dedica grande parte do seu tempo pessoal à oração. Entretanto, há grande risco em pensar assim, de forma tão estreita.
Espiritualidade é uma atitude de docilidade e de atenção constante às orientações que o Espírito Santo nos dá. E o vento do Espírito Santo nos dá. E o vento do Espírito sempre nos impulsiona na direção dos outros. Produz em nós um movimento para fora de nós mesmos, fazendo-nos solidários com i caminho dos irmãos e irmãs. Disso podemos ter toda a certeza: nunca o Espírito Santo produz nas pessoas orantes atitudes de egoísmo e de fechamento. O Espírito de Deus é o Espírito da missão: como aos primeiros discípulos, leva-nos para fora do cenáculo e nos enche de entusiasmo, para nos relacionarmos com nosso próximo por meio da linguagem universal do amor (cf. At 2).
Assim a experiência do martírio de Deus passa necessariamente pela experiência do mistério do outro. No fundo do olhar de nossos irmãos e irmãs – sobretudo daqueles que mais necessitam de nossa palavra de conforto, de nossa mão amiga – podemos reverenciar a presença do Deus altíssimo. Quem nos garante é o próprio Jesus Cristo (cf. Mt 11,40-42; 18,1-4; 25,31-45; Jo 13,12-20): cada um de nós irmãos e irmãs é, para nós, sacrário vivo de Deus.
O castelo interior e o castelo exterior
A grande Santa Teresa D’Ávila falava da vida íntima de amizade com Deus comparando-a a um “castelo interior”. Estreitar os laços de amizade com Deus significaria, segundo uma bela imagem empregada por Santa Teresa, deixar que o Senhor fosse ocupando mais e mais moradas de nossa alma, até que pudesse chegar e se hospedar nos cômodos mais íntimos de nosso coração, tornando-se Senhor absoluto de nossa vida. Para Deus, segundo a mística carmelita, não pode haver portas trancadas em nosso interior.
Entretanto, hoje é muito importante falar também na necessidade de construir um “castelo interior” para Deus. Ele habita não só no íntimo de cada pessoa, mas também arma a sua tenda onde há comunhão entre os irmãos. Diz Jesus: “Onde dois ou três estiverem reunidos, em meu nome, eu estarei no meio deles” (Mt 18,20). Desse modo, a presença de Deus se faz mais viva em nossa vida quando estamos unidos em seu nome, vivendo como “um só coração e uma só alma” (At 4,32). Devemos deixar Deus morar não só em nós, mas também no meio de nós. Somos mais amigos de Deus quando somos mais amigos dos outros. E vice-versa: quanto mais diferentes ao nosso próximo, mais nos ocultamos da face do Senhor.
O grupo de catequistas: casa em que Deus quer fazer sua morada
Um modo excelente de construirmos para Deus esse “castelo exterior” é por meio do cultivo de uma espiritualidade do grupo de catequistas. Momentos fortes de oração comunitária e de partilha da vida e da Palavra são fundamentais para os catequistas permaneçam juntos e perseverantes na vocação. Tais oportunidades devem ser bastante valorizadas e preparadas com muito zelo e carinho.
Todavia, a espiritualidade é atitude de docilidade ao Espírito que atravessa todos os momentos da vida; no grupo de catequistas, ela se alimentará a todo tempo de pequenos gestos de amor e atenção entre os colegas: uma conversa amiga, uma troca de experiências, uma dica legal para dinamizar os encontros, uma oferta de ajuda, um abraço de feliz aniversário... São esses gestos que costuram a tenda de Deus no meio de nós.
Pode-se ir mais além: o grupo de catequistas de uma comunidade precisa rezar junto e viver unido, para que possa ser para o mundo espelho daquela comunhão que há na própria Trindade Divina: “Que todos sejam um só; como tu, ó Pai, estás em mim e eu em ti, que também eles estejam em nós, para que o mundo creia que tu me enviaste. Dei-lhes a glória que tu me deste, para que sejam um como nós somos um. Eu neles e tu em mim, para que eles sejam perfeitos na unidade e para que o mundo reconheça que tu me enviaste e os amaste, como me amaste a mim” (Jo 17,20-23).
Que o Espírito nos uma num só corpo, a fim de que sejamos um, para que o mundo creia!
Revista ECOANDO – Formação Interativa com Catequistas – Ano IV – nº 14.